quarta-feira, 17 de junho de 2020

Omeprazol + quimioterapia aumentou resposta patológica completa em pacientes com câncer de mama

Por: Nick Mulcahy



omeprazol, um inibidor da bomba de prótons, pode ser um acréscimo oportuno ao tratamento do câncer de mama triplo negativo, pois o uso do medicamento aumentou a taxa de desaparecimento do tumor estimada para mulheres com doença em estágio inicial, de acordo com os resultados de um estudo de fase 2.
Os resultados do ensaio clínico foram apresentados on-line na reunião anual de 2020 da American Society of Clinical Oncology (ASCO).
A lógica por trás dessa estratégia considera o fato os inibidores da bomba de prótons inibirem a enzima ácido graxo sintase (FASN, sigla do inglês, Fatty Acid Synthase), exacerbadamente presente em 70% dos casos de câncer de mama triplo negativo recém-diagnosticados e associada a mau prognóstico.
Nesse estudo de braço único, o omeprazol, um medicamento genérico usado para o refluxo gastroesofágico, foi adicionado à quimioterapia padrão. O esquema terapêutico foi administrado em 42 mulheres como tratamento neoadjuvante nas semanas anteriores à cirurgia de mama em cinco centros dos Estados Unidos.
A taxa de resposta patológica completa (pCR) foi de 71% na população do estudo, mais alta que os 40% tipicamente observados em pacientes tratadas com AC-T padrão (adriamicina + ciclofosfamida + algum taxano), disse o primeiro autor do estudo, Dr. Sagar Sardesai, oncologista do Ohio State Comprehensive Cancer Center, nos EUA.
"É emocionante", disse o Dr. Sagar em uma entrevista ao Medscape. "No geral, pacientes triplo negativos que atingem a resposta patológica completa têm um desfecho muito bom."
Esse desaparecimento completo do tumor é um substituto para a sobrevida global no câncer de mama triplo negativo e as pacientes que o atingem têm um risco muito reduzido de recorrência ou morte, explicou ele.
A Dra. Natalie Berger, oncologista da Icahn School of Medicine at Mount Sinai, nos EUA, disse que as taxas de resposta patológica completa do estudo foram "muito mais altas" do que o esperado, bem como "intrigantes e geradoras de hipóteses".
Mas a Dra. Natalie, que não participou do estudo, gostaria de ver mais dados.
"Ter um medicamento que não é quimioterápico para oferecer aos nossos pacientes com câncer de mama triplo negativo, que melhora as taxas de  resposta patológica completa sem toxicidade adicional seria um achado animador, mas precisamos de um estudo randomizado maior", disse a médica por e-mail.
Os pesquisadores, dentre os quais a especialista em câncer de mama de renome, Dra. Kathy Miller, médica da Indiana University, nos EUA, estão buscando financiamento do National Cancer Institute ou do Department of Defense para montar um estudo randomizado com mais de 100 pacientes.
Possível alvo terapêutico por alguns anos
O Dr. Sagar explicou que a enzima ácido graxo sintase ajuda a gerar ácidos graxos essenciais para a sobrevivência das células cancerígenas. A FASN é encontrada principalmente em tecidos com muitos hormônios, como o endométrio, a próstata e a mama.
Os inibidores da bomba de prótons "inibem seletivamente a atividade da FASN e induzem a apoptose das células do câncer de mama com efeito mínimo nas células que não são malignas", escreveram os autores do estudo no Abstract da reunião.
O único outro agente conhecido que sabidamente inibe a FASN é o orlistate, um medicamento usado para perda ponderal que é pouco absorvido pelo organismo e provavelmente não afeta as células cancerígenas, disse o Dr. Sagar.
A FASN tem sido um possível alvo terapêutico no câncer de mama triplo negativo há 10 a 15 anos, mas a primeira evidência clínica de eficácia em tumores sólidos só foi vista nos últimos cinco anos, ele comentou.
Em 2015, pesquisadores chineses relataram que a associação de esomeprazol, outro inibidor da bomba de prótons, à quimioterapia resultou em um ganho de cinco meses de sobrevida livre de progressão (versus quimioterapia isolada) em um subconjunto de 15 pacientes com câncer de mama triplo negativo provenientes de um estudo randomizado com 97 pacientes que tinham vários tipos de câncer de mama.
Sem toxicidade adicional, mas com alguns achados inesperados
Os pacientes do estudo tinham câncer de mama triplo negativo ressecável em estágio inicial (com e sem presença de FASN ao início do estudo) que não haviam sido tratados com inibidor da bomba de prótons nos 12 meses anteriores ao trabalho.
Todas as pacientes começaram tomando omeprazol em altas doses diárias durante quatro a sete dias antes do início da quimioterapia neoadjuvante AC-T (o acréscimo da carboplatina foi permitido, de acordo com o critério do médico) e continuaram até a cirurgia.
O desfecho primário foi a resposta patológica completa, definida como nenhuma doença invasiva residual na mama ou axila, em pacientes com presença de FASN ao início do estudo (FASN+).
A taxa de resposta patológica completa foi de 71,4% nas 28 pacientes com FASN+ e 71,8% em todas as 42 participantes. O objetivo dos pesquisadores era alcançar uma taxa de resposta patológica completa de 60% nas pacientes FASN+.
Além disso, no subconjunto de 15 pacientes que receberam carboplatina com AC-T, a resposta patológica completa foi de 73%.
Esses dois achados têm limitações, comentou a Dra. Natalie.
Ela ressaltou que "não foi explicado" o motivo das taxas de resposta patológica completa terem sido semelhantes entre os pacientes com FASN+ e a população total (incluindo as 14 pacientes FASN-); seria de esperar que a taxa de resposta patológica completa fosse menor na população total, sugeriu ela.
Além disso, também não foi explicado o motivo das taxas semelhantes de resposta patológica completa com ou sem carboplatina; outra pesquisa demonstrou melhores taxas de resposta patológica completa em pacientes que receberam carboplatina adicional (versus AC-T isolado), mas ao custo de maior toxicidade, disse ela.
O Dr. Sagar disse que o omeprazol foi bem tolerado e sem toxicidade de grau 3 ou 4. A toxicidade da quimioterapia foi semelhante à de estudos anteriores de AC-T. Os inibidores da bomba de prótons têm efeitos colaterais se tomados por mais de um ano, como aumento do risco de infecções, osteoporose e magnésio baixo, ele comentou.
"O omeprazol pode ser administrado com segurança em doses que inibem a FASN. A adição de omeprazol em altas doses ao AC-T neoadjuvante produziu uma taxa promissora de resposta patológica completa sem aumentar a toxicidade", concluíram os autores.
O Dr. Sagar também destacou o fato de que o uso de um inibidor da bomba de prótons para câncer de mama é um exemplo de reposicionamento de medicamentos. Esta estratégia é uma maneira de desenvolvimento rápido de medicamentos, porque os inibidores da bomba de prótons têm dados completos sobre segurança e farmacocinética disponíveis, disse ele. "Se pudermos provar a eficácia, o tratamento poderá avançar rapidamente e estar disponível na prática clínica muito mais cedo do que no processo tradicional de desenvolvimento de medicamentos."
O estudo foi financiado pela Breast Cancer Research Foundation. O Dr. Sagar Sardesai informou ter relações financeiras com a Novartis e a Immunomedics. Outros autores do estudo mantêm relações com a indústria. A Dra. Natalie Berger informou não ter conflitos de interesses relevantes.
American Society of Clinical Oncology (ASCO) 2020: Abstract 584
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Fonte: Medscape



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