sábado, 29 de dezembro de 2018

Poemas I


O teu riso – Neruda 


Tira-me o pão, se quiseres,
tira-me o ar, mas não
me tires o teu riso.
Não me tires a rosa,
a lança que desfolhas,
a água que de súbito
brota da tua alegria,
a repentina onda
de prata que em ti nasce.
A minha luta é dura e regresso
com os olhos cansados
às vezes por ver
que a terra não muda,
mas ao entrar teu riso
sobe ao céu a procurar-me
e abre-me todas
as portas da vida.
Meu amor, nos momentos
mais escuros solta
o teu riso e se de súbito
vires que o meu sangue mancha
as pedras da rua,
ri, porque o teu riso
será para as minhas mãos
como uma espada fresca.
À beira do mar, no outono,
teu riso deve erguer
sua cascata de espuma,
e na primavera, amor,
quero teu riso como
a flor que esperava,
a flor azul, a rosa
da minha pátria sonora.
Ri-te da noite,
do dia, da lua,
ri-te das ruas
tortas da ilha,
ri-te deste grosseiro
rapaz que te ama,
mas quando abro
os olhos e os fecho,
quando meus passos vão,
quando voltam meus passos,
nega-me o pão, o ar,
a luz, a primavera,
mas nunca o teu riso,
porque então morreria.


Soneto da Fidelidade (Vinicius de Moraes)

De tudo, ao meu amor serei atento
Antes, e com tal zelo, e sempre, e tanto
Que mesmo em face do maior encanto
Dele se encante mais meu pensamento.
Quero vivê-lo em cada vão momento
E em louvor hei de espalhar meu canto
E rir meu riso e derramar meu pranto
Ao seu pesar ou seu contentamento.
E assim, quando mais tarde me procure
Quem sabe a morte, angústia de quem vive
Quem sabe a solidão, fim de quem ama
Eu possa me dizer do amor (que tive):
Que não seja imortal, posto que é chama
Mas que seja infinito enquanto dure.

Sou o Que Sou e Como Sou / Clarice Lispector


Sou o que quero ser, porque possuo apenas uma vida e nela só tenho uma chance de fazer o que quero.
Tenho felicidade o bastante para fazê-la doce dificuldades para fazê-la forte,
Tristeza para fazê-la humana e esperança suficiente para fazê-la feliz.
As pessoas mais felizes não tem as melhores coisas,
elas sabem fazer o melhor das oportunidades que aparecem em seus caminhos.




Sem Mais Lágrimas / Charles Chaplin


Chorar não resolve, falar pouco é uma virtude, aprender a se colocar em primeiro lugar não é egoismo. Para qualquer escolha se segue alguma consequência, vontades efêmeras não valem a pena, quem faz uma vez, não faz duas necessariamente, mas quem faz dez, com certeza faz onze. Perdoar é nobre, esquecer é quase impossível. Quem te merece não te faz chorar, quem gosta cuida, o que está no passado tem motivos para não fazer parte do seu presente, não é preciso perder pra aprender a dar valor, e os amigos ainda se contam nos dedos.

Aos poucos você percebe o que vale a pena, o que se deve guardar pro resto da vida, e o que nunca deveria ter entrado nela. Não tem como esconder a verdade, nem tem como enterrar o passado, o tempo sempre vai ser o melhor remédio, mas seus resultados nem sempre são imediatos.




Amizade Inseparável / Vinicius de Moraes


Eu talvez não tenha muitos amigos.
Mas os que eu tenho são os melhores que alguém poderia ter.
Além disso tenho sorte, porque os amigos que tenho têm muitos
amigos e os dividem comigo.
Assim o meu número de amigos sempre aumenta, já que eu sempre ganho amigos dos meus amigos.
Foi assim aqui, uns eu ganhei há tempos, outros são mais recentes.
E quem os deu não ficou sem eles, pois a amizade pode sempre ser
dividida sem nunca diminuir ou enfraquecer.
Pelo contrário, quanto mais dividida, mais ela aumenta.
E há mais vantagens na amizade: é uma das poucas coisas que não
custam nada e valem muito, embora não sejam vendáveis.
Entretanto, é preciso que se cuide um pouco das amizades. As mais recentes, por exemplo, precisam de alguns cuidados... Poucos, é verdade, mas indispensáveis.
É preciso mantê-las com um certo calor, falar com elas mais amiúde e no início, com muito jeito.
Com o tempo elas crescem, ficam fortes e até suportam alguns trancos.

Prezo muito minhas amizades e reservo sempre um canto no
meu peito para elas.
E, sempre que surge a ocasião, também não perco a oportunidade de dar um amigo a um amigo, da mesma forma que eu ganhei.
E não adiantam as despedidas, de um amigo ninguém se livra fácil.
A amizade além de contagiosa é totalmente incurável.

Quando – Sophia de Mello Breyner

Quando o meu corpo apodrecer e eu for morta
Continuará o jardim, o céu e o mar,
E como hoje igualmente hão-de bailar
As quatro estações à minha porta.
Outros em Abril passarão no pomar
Em que eu tantas vezes passei,
Haverá longos poentes sobre o mar,
Outros amarão as coisas que eu amei.
Será o mesmo brilho, a mesma festa,
Será o mesmo jardim à minha porta,
E os cabelos doirados da floresta,
Como se eu não estivesse morta.

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