domingo, 26 de abril de 2020

Hipocondria em tempos de coronavírus

O que é a hipocondria? Como a pandemia pode afetar as pessoas com essa condição e as suas famílias? É importante saber como agir para ajudá-las e impedir que o confinamento agrave os sintomas desse transtorno.



O novo coronavírus colocou o mundo em xeque pela sua velocidade de propagação e pela sua letalidade. Essa situação pode causar medo, ansiedade e incerteza na população, mas existe um grupo particularmente vulnerável no que diz respeito à ansiedade e ao medo de contágio: os hipocondríacos e pessoas com fobia de doenças. A seguir, falaremos sobre a hipocondria em tempos de coronavírus.
Vamos revisar os principais sintomas do transtorno e compartilharemos algumas orientações que podem ajudar tanto as pessoas com hipocondria quanto aqueles que vivem com uma pessoa hipocondríaca. No entanto, o mais importante sempre é pedir ajuda profissional.
Mulher preocupada por coronavírus

O que é a hipocondria e como ela está relacionada ao coronavírus?

A sintomatologia da hipocondria (agora denominada “transtorno de ansiedade por doenças”) consiste em preocupação, medo ou convicção de ter uma doença médica grave não diagnosticada devido a uma má interpretação das sensações físicas. A hipocondria inclui as seguintes características:
  • Os hipocondríacos geralmente consideram ameaçadoras sensações fisiológicas normais, reações somáticas desencadeadas por estados emocionais e disfunções benignas. Um exemplo pode ser a interpretação de uma dispneia leve, após subir escadas rapidamente, como um sintoma de coronavírus.
  • Além de pensamentos catastrofistas em relação aos sintomas, é comum que os hipocondríacos tenham imagens mentais relacionadas à doença. Por exemplo, eles podem se imaginar intubados em uma UTI.
  • Os hipocondríacos dedicam muito tempo a autoexames e à verificação das funções corporais. Eles mantêm uma vigilância excessiva diante do aparecimento de possíveis sinais de doenças. Por exemplo, utilizam o termômetro a cada hora ou verificam se a sua capacidade pulmonar não diminuiu.
  • A preocupação ocupa um papel central na vida dos hipocondríacos. Eles evitam atividades normais por medo de se contagiarem. Por exemplo, eles se recusam a sentar no mesmo sofá que o resto da família ou concentram todas as suas conversas em torno de doenças.
  • Esse transtorno geralmente está associado ao doctor shopping (busca insistente por assistência médica), o que pode resultar em chamadas repetitivas para as linhas de apoio a vítimas do coronavírus. Também está associado à cibercondria, que é a busca compulsiva na internet por sintomas da doença. No entanto, alguns hipocondríacos rejeitam qualquer tipo de assistência médica por medo de confirmar a doença.
  • Os hipocondríacos também tendem a ter altos níveis de ansiedade e podem ter sintomas somáticos.

Quem é afetado por esse transtorno e como é o curso dessa condição?

A hipocondria afeta entre 1% e 5% da população geral, embora esse percentual seja ligeiramente maior na população clínica, afetando entre 2% e 7%. Esse transtorno não faz distinção de gênero, afetando mulheres e homens na mesma proporção.
Pode começar em qualquer idade, mas o mais comum é aparecer no início da vida adulta, com um pico de prevalência entre 30 e 40 anos.
O curso do transtorno geralmente é crônico e raramente remete de maneira completa. Os sintomas costumam apresentar variações.
Pode haver períodos em que os sintomas são mínimos e outros em que, devido às circunstâncias, a condição se agrava (por exemplo, no momento atual, ao estar confinado por conta da pandemia).

Como uma pessoa “se torna” hipocondríaca?

Existem várias explicações sobre a origem e a manutenção da hipocondria. A seguir, faremos uma revisão das teorias mais atuais.
Do ponto de vista cognitivo-perceptivo, a hipocondria é abordada como uma manifestação de uma alteração a nível cognitivo ou perceptivo e, com base nisso, são elaboradas várias hipóteses:
  • Barsky e Klerman explicam que os hipocondríacos têm um estilo atencional caracterizado pela amplificação dos sinais corporais. Isso leva a uma hipervigilância de sinais corporais desagradáveis, a uma atenção seletiva a sintomas leves e a uma tendência a valorizar sensações normais como anormais.
  • Keller explica que, por um lado, existem certas experiências iniciais que predispõem a sintomas somáticos. Por outro lado, existem certos fatores que atuam como gatilhos. Ele concluiu que a aprendizagem precoce de comportamentos de saúde (por exemplo, o autoexame) pode ser um fator de risco para o desenvolvimento da hipocondria.
  • Warwick e Salkovskis desenvolveram um modelo que explica que experiências relativas à doenças levam à formação de crenças disfuncionais sobre a saúde. Essas crenças permanecem latentes até que um evento crítico desencadeie o aparecimento de pensamentos negativos automáticos, causando atenção seletiva aos sintomas e aumento da ansiedade.
Por outro lado, a partir da perspectiva psicossocial, a hipocondria é explicada como um modo particular de comunicação, e argumenta-se que as pessoas hipocondríacas têm déficits de comunicação e se expressam através dos sintomas.

O que fazer diante da hipocondria?

O mais importante deve ser procurar ajuda psicológica para lidar com a ansiedade, o medo e os pensamentos negativos. No entanto, as seguintes orientações podem servir como uma ajuda inicial:
  • Esteja ciente do problema. Analise sua experiência e os fatores que desencadeiam os pensamentos hipocondríacos.
  • Mude o foco da atençãoVocê pode aprender técnicas de meditação para ajudá-lo a permanecer no “aqui e agora”.
  • Evite ler notícias sobre a pandemia constantemente ou pesquisar na internet informações sobre os sintomas da COVID-19.
  • Não deixe sua vida inteira girar em torno do problema, faça dos pensamentos positivos sua melhor arma.
  • Não deixe que os pensamentos negativos e catastrofistas o dominem.
  • Busque explicações alternativas que possam explicar seus sintomas.
  • Evite o “efeito do urso branco”. A única coisa que a tentativa de evitar pensar em um urso branco provoca é a incapacidade de parar de pensar nele. O mesmo vale para os sintomas e as sensações corporais.
  • Não se sinta culpado.
  • Evite o drama excessivo. Lembre-se de que o que você sente são sintomas somáticos desencadeados por uma emoção negativa. Eles são desconfortáveis, mas não perigosos, e acabarão desaparecendo.
  • Valorize seu progresso e se recompense.
Mulher em sessão de terapia

Como ajudar alguém com hipocondria durante a crise do coronavírus?

Os pontos que listamos a seguir são boas ideias que você pode colocar em prática:
  • Seja empático, tenha paciência e não julgue. Tente se colocar no lugar da outra pessoa e imagine o medo que ela pode sentir ao pensar que tem uma doença (neste caso, a COVID-19).
  • Incentive-o a buscar ajuda psicológica.
  • Não reforce suas preocupações hipocondríacas.
  • Evite a superproteção.
  • Se ele tiver que ir a um exame médico, estiver com medo e você não puder acompanhá-lo por conta da quarentena, ajude-o a manter a calma.
  • Não deixe que ele ceda ao desejo de ir ao médico novamente para “ter certeza” ou ligar para o número do serviço de atendimento ao coronavírus repetidamente. Fazer isso reduziria a ansiedade a curto prazo, mas manteria o problema a longo prazo.
  • Ajude-o a se concentrar em pensamentos positivos.
  • Incentive-o a procurar distrações positivas.
  • Ajude-o a se recompensar pelos pequenos progressos.
A hipocondria é algo difícil de gerenciar, já que costuma estar associada a transtornos de ansiedade. O confinamento nos coloca em uma situação à qual não estamos acostumados e nos predispõe a ter sintomas de ansiedade.
É de se esperar que tanto a quarentena quanto o contexto da própria pandemia de coronavírus possam agravar os sintomas de pessoas com hipocondria.
As orientações mencionadas acima podem ajudar, mas não são uma solução para o problema. O mais aconselhável é procurar tratamento especializado ou continuar com o que já estava sendo seguido, quando a quarentena terminar.


As informações e sugestões contidas neste blog são meramente informativas e não devem substituir consultas com médicos especialistas.

É muito importante (sempre) procurar mais informações sobre os assuntos.

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