Nota da editora: Veja as últimas notícias e orientações sobre a covid-19 em nosso Centro de Informações sobre o novo coronavírus SARS-CoV-2.
Com as aprovações de uso emergencial das primeiras vacinas contra a covid-19, os médicos provavelmente serão submersos em perguntas. As atitudes do público sobre as vacinas variam de acordo com características demográficas, com uma sondagem recente – feita nos Estados Unidos – mostrando que homens e adultos mais velhos têm maior probabilidade de optar por se vacinar, e mulheres e pessoas não brancas estão demonstrando mais cautela.
Embora as razões de relutância possam variar, as perguntas dos pacientes provavelmente serão semelhantes. Algumas estão relacionadas com a questão da "fabricação a toque de caixa" das vacinas. Outras preocupações advêm do fato de a plataforma utilizada em algumas delas – RNAm – nunca ter sido usada antes em vacinas para humanos. E, tal como acontece com qualquer vacina, existem rumores e falsas alegações brotando nas redes sociais.
Prevendo as perguntas mais comuns que os médicos podem ter de responder, o Medscape chamou dois especialistas, a Dra. Krutika Kuppalli, médica e professora assistente de medicina no Departamento de Doenças Infecciosas da Medical University of South Carolina, e a Dra. Angela Rasmussen, Ph.D., virologista e afiliada não residente no Georgetown University's Center for Global Health Science and Security, para falarem sobre o que os médicos podem esperar e quais respostas baseadas em evidências podem dar – inclusive as compassivas.
Eu posso pegar covid-19 por tomar a vacina?
"Não existe vírus inteiro na vacina", disse a Dra. Angela. As vacinas de RNAm não podem causar covid-19, porque não contêm nenhuma parte do próprio coronavírus. Em vez disso, as vacinas da Moderna e da Pfizer contêm moléculas RNAm fabricadas que transportam instruções para a construção da proteína do espigão do vírus. Após a aplicação da vacina, as células do próprio receptor absorvem este RNAm e o utilizam para construir este pedaço de proteína e levá-lo até a superfície da célula. Essa proteína estranha ao organismo humano deflagra a resposta do sistema imunitário.
O RNAm não entra no núcleo da célula nem interage com o DNA do receptor. E por ser tão frágil, degrada-se muito rapidamente. Para evitar que isso aconteça antes de sua entrada na célula, os RNAm são envoltos em uma camada lipídica.
Esta vacina foi feita rápido demais?
"Há 30 anos que as pessoas trabalham nesta plataforma, então não é como se isso fosse uma total novidade", afirmou a Dra. Krutika.
Os pesquisadores começaram a trabalhar nas vacinas de RNAm na década de 90. Os desenvolvimentos tecnológicos da década passada viabilizaram a sua utilização, e essas vacinas foram testadas em animais contra muitas doenças virais. As vacinas de RNAm são interessantes porque se espera que sejam seguras e facilmente fabricadas a partir de materiais comuns. É isso que vimos na pandemia da covid-19, de acordo com o que os Centers for Disease Control and Prevention (CDC) dos EUA informam em seu site . O desenho do componente do espigão viral no RNAm começou assim que o genoma viral ficou disponível, em janeiro de 2020.
Normalmente, a implementação de uma vacina demora anos, de modo que menos de um ano, sob a égide de um programa chamado Operation Warp Speed, pode parecer muito rápido, reconhece Dra. Angela. "O nome da operação (em tradução livre: 'a toque de caixa') deu às pessoas a impressão de que fazendo as coisas o mais rápido possível estamos fazendo de qualquer maneira. Mas a realidade é que a pressa da operação Warp Speed diz respeito principalmente à fabricação e distribuição."
O que está sendo feito mais rápido é a reestruturação do processo normal de desenvolvimento das vacinas, disse Dra. Krutika. As mesmas fases de desenvolvimento – testes em animais, uma pequena fase inicial em humanos, uma segunda para os testes de segurança, uma terceira grande fase de eficácia – foram todas realizadas como para qualquer vacina. Mas, neste caso, algumas fases foram concluídas em paralelo, em vez de sequencialmente. Esta abordagem provou ser tão bem-sucedida que já se fala em torná-la o modelo para o desenvolvimento de novas vacinas no futuro.
Dois outros fatores contribuíram para a velocidade, disseram Dra. Krutika e Dra. Angela. Inicialmente, a montagem da produção pode retardar a implementação, mas com estas vacinas, as empresas aumentaram a produção mesmo antes de qualquer pessoa saber se as vacinas iriam funcionar – a parte do 'toque de caixa'. O segundo fator tem sido o grande número de casos, fazendo com que as exposições sejam mais prováveis e acelerando assim os resultados dos ensaios clínicos de eficácia.
"Há tanto SARS-CoV-2 sendo transmitido nos Estados Unidos que não demorou muito para atingir o limiar de eventos para analisar a fase 3", disse Dra. Angela.
Esta vacina nunca foi usada em humanos. Como sabemos que é segura?
O ensaio clínico de fase 3 da Pfizer foi feito com mais de 43.000 pessoas, e o da Moderna contou com mais de 30.000 participantes. Os primeiros humanos receberam vacinas anticovídicas de RNAm em março. Os eventos adversos mais comuns aparecem logo após a aplicação da vacina, disse Dra. Krutika.
Tal como acontece com qualquer vacina aprovada, a monitorização continuará sendo realizada.
As autoridades de saúde do Reino Unido informaram que dois profissionais de saúde vacinados na fase inicial da vacina da Pfizer tiveram o que parece ter sido uma resposta alérgica grave. Os dois tinham história de anafilaxia e estavam sempre com suas canetas de adrenalina Epi-Pen, e ambos se recuperaram. Durante o ensaio clínico, a incidência de reação alérgica foi de 0,63% no grupo vacinal e de 0,51% no grupo do placebo.
Como resultado das duas reações, os regulamentadores britânicos recomendaram agora que os pacientes com história de alergia grave não recebam a vacina neste momento.
Quais são os possíveis efeitos secundários?
Até o momento, os efeitos colaterais mais comuns são dor no local da injeção e uma sensação de dolorimento, parecida com a gripe, disse Dra. Krutika. Foram notificadas reações mais graves, mas isso não foi comum nos ensaios clínicos.
A Dra. Angela observou que os efeitos colaterais comuns são um bom sinal, sinal de que o receptor está gerando "uma forte resposta imunitária".
"Todos com quem eu conversei que tiveram reações colaterais disseram que fariam tudo de novo", disse Dra. Krutika. "Estou decidida a entrar na fila e ser uma das primeiras pessoas a tomar a vacina."
Eu já tive covid-19 ou tive sorologia positiva. Ainda assim preciso tomar a vacina?
A Dra. Angela diz que há "incógnitas demais" para dizer se a história de covid-19 faria diferença. "Nós não sabemos quanto tempo os anticorpos neutralizantes duram" após a infecção, disse a médica. "O que sabemos é que a vacina tende a produzir títulos de anticorpos em direção à extremidade mais alta do espectro", sugerindo maior imunidade com a vacinação do que após a infecção natural.
Pacientes não brancos podem se sentir seguros de tomar a vacina?
"As pessoas não brancas podem estar compreensivelmente relutantes em tomar uma vacina que foi desenvolvida de uma forma que parece ser mais rápida do que o habitual", disse Dra. Angela. A professora diz que os médicos devem reconhecer e compreender a história que os leva a se sentirem assim, "tudo, de Tuskegee a Henrietta Lacks, até hoje".
A empatia é fundamental, e "os profissionais de saúde devem falar com os pacientes de igual para igual, sem ser paternalistas". A Dra. Krutika concorda. "Os médicos precisam realmente se esforçar para eliminar os próprios preconceitos."
Até agora, não existem sinais de segurança que difiram por raça ou etnia, segundo as empresas. O ensaio da fase 3 da Pfizer recrutou pouco mais de 9% de participantes negros, 0,5% nativos norte-americanos e/ou nativos do Alasca, 0,2% nativos do Havaí e/ou Ilhas do Pacífico, 2,3% participantes multirraciais e 28% hispânicos e/ou latinos. Por sua vez, a Moderna diz que cerca de 37% dos participantes do seu ensaio clínico de fase 3 são provenientes de comunidades não brancas.
E as crianças e as gestantes?
Embora os estudos tenham tido a participação de diferentes faixas etárias e origens, crianças e gestantes ou lactantes não participaram. Em outubro, a Pfizer obteve aprovação para recrutar participantes com 12 anos de idade, e um porta-voz da Moderna disse ao Medscape que a empresa planeja a inclusão de crianças no final de 2020, após sua aprovação.
"Infelizmente, não temos dados sobre gestantes e lactantes", disse a Dra. Krutika. A médica espera que organizações de saúde pública, como os CDC, abordem isso nas próximas semanas. A Dra. Angela afirmou que a falta de dados sobre gestantes e crianças é uma "enorme negligência".
A Dra. Angela Rasmussen informou não ter conflitos de interesses relevantes. A Dra. Krutika Kuppalli é consultora da GlaxoSmithKline.
Siga o Medscape em português no Facebook, no Twitter e no YouTube
Fonte: Medscape
As informações e sugestões contidas neste blog são meramente informativas e não devem substituir consultas com médicos especialistas.
É muito importante (sempre) procurar mais informações sobre os assuntos
Nenhum comentário:
Postar um comentário