domingo, 29 de setembro de 2019

Por que as drogas contra o câncer não são melhores? Alvos podem estar errados

Estudo constatou que medicamentos que atacam alguns genes nas células cancerosas podem não atacar outros. Foto: A.Lin et al., Science Translational Medicine, 2019


Há vinte anos, parecia que a luta contra o câncer estava tomando um rumo dramático. Os médicos combatiam a doença com armas toscas, envenenando as células de crescimento rápido, fossem elas cancerosas ou saudáveis. Mas então os pesquisadores chegaram a uma nova estratégia: drogas que visavam proteínas produzidas por células cancerosas aparentemente necessárias para a sua sobrevivência. Uma destas drogas, a Gleevec, funcionou de maneira espetacular nos pacientes com leucemia mieloide crônica. Mas os testes clínicos que se seguiram foram decepcionantes

Um estudo publicado recentemente pela revista Science Translational Medicine, aponta uma razão para a falha: os cientistas estão combatendo os alvos errados. Jason Sheltzer, biólogo do câncer do Laboratório Cold Spring Harbor, no estado de Nova York, e os seus colegas fizeram a descoberta quando tentavam obter um novo teste para o câncer de mama.

Em algumas formas da doença, as células cancerosas produzem níveis elevados de uma proteína chamada MELK. Estudos anteriores haviam indicado que a MELK era essencial para o alastramento do câncer; os pesquisadores já estavam testando uma droga contra o câncer de mama que ataca esta proteína. A equipe de Sheltzer utilizou o Crispr, uma ferramenta que edita o DNA, para arrancar o gene da MELK nas células cancerosas. As células deveriam parar de crescem, mas não era o que acontecia. “As células do câncer não ligaram a mínima”, contou o cientista.

Mais estranho foi o que aconteceu quando os cientistas expuseram as células à droga que combatia a MELK. Ela deteve as células do câncer - embora elas não contivessem o gene que o medicamento deveria atacar. A equipe de Sheltzer realizou o mesmo experimento com outras drogas que comumente tinham como alvo a proteína em testes clínicos. 

Os cientistas obtiveram os mesmos resultados com cada droga. Todas as proteínas consideradas essenciais revelaram-se descartáveis, entretanto as células paravam de crescer quando os cientistas aplicavam a droga. Este tipo de erro pode levar ao fracasso dos testes clínicos, observou Sheltzer. “Inúmeros alvos das drogas usadas hoje nos testes clínicos foram descobertos com a melhor tecnologia de cinco a 10 anos atrás”, afirmou.

Na época, parecia que esta tecnologia, conhecida como RNAi, conseguiria zerar os alvos do câncer com grande precisão. Mas alguns críticos questionaram se a RNAi seria mesmo tão precisa. A técnica pode bloquear não apenas a proteína visada, mas também algumas outras. Sheltzer testou esta possibilidade com uma das drogas usadas no seu experimento, a OTS964.

Os pesquisadores aplicaram a droga a colônias de células cancerosas em que a proteína visada havia sido retirada. A maioria delas morreu, mas algumas não. 

Todas as células sobreviventes apresentavam mutações no mesmo gene, o que codifica uma proteína chamada CDK11B. O experimento de Sheltzer sugeriu que a proteína era essencial para a sobrevivência das células. Quando os pesquisadores eliminaram o gene CDK11B, as células cancerosas morreram.
Segundo Traver Hart, um biólogo do câncer que não participou do novo estudo, os cientistas precisam estudar mais a fundo as drogas contra o câncer que estão sendo testadas atualmente. Isto não significa que atacar as proteínas essenciais seja inútil. Os cientistas precisam apenas ter a certeza de que estão atacando as proteínas certas. “Existe provavelmente todo um universo de alvos de drogas ainda não exploradas nas células cancerosas”, disse Sheltzer. / TRADUÇÃO DE ANNA CAPOVILLA


Fonte: Oncoguia / Estadão


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