Divulgação/Amanhã Hoje É Ontem
O que você faria se descobrisse, abruptamente, durante a realização
de exames de rotina, que é portadora de uma doença que pode acabar com a
sua existência a qualquer momento? Foi a situação que a apresentadora
do programa Agenda - da Rede Minas - Daniella Zupo,
viveu aos seus 43 anos, em um gélido consultório médico. "Não me senti
traída pelo destino com a ciência do diagnóstico de câncer de mama, mas,
por um instante, veio o sentimento de ter sido derrubada pela vida
quando estava olhando para o outro lado - algo que jamais esperava e que
me machucou muito, que doeu lá no fundo", relembra.
Depois da realização do auto-exame, a mineira descobriu uma área
endurecida na mama esquerda e resolveu ir ao médico: "Fiquei em choque,
muito angustiada. Ninguém está preparado para isso, mesmo que possua
histórico familiar, o que não era o meu caso. De cara já me submeteram a
uma ultrassonografia, e logo depois, a uma biópsia. É uma certeza que
você vai recebendo em etapas conforme os resultados vão saindo. Aquelas
semanas duraram muito mais tempo para mim."
Logo depois da notícia, a jornalista foi submetida a sessões de
quimioterapia, radioterapia e à ressecção (retirada parcial) da mama
esquerda, em outra unidade hospitalar. O processo, iniciado no final de
2015, totaliza até agora 11 meses. E não se resumiu apenas a uma
traumática experiência pessoal: tornou-se uma delicada, íntima e
visceral websérie, intitulada Amanhã Hoje É Ontem, que retrata a superação diária de Daniella pelos caminhos tortuosos da cura.
A aceitação do diagnóstico talvez seja uma das tarefas mais árduas e necessárias de todo o tratamento que, a princípio, também é negado pela própria família: "Quando você admite para si mesma que aquilo é real, passa a se concentrar na cura. Nesse momento, o susto passa, porque há duas escolhas: permanecer na postura de vítima ou aceitar a enfermidade entendendo que você não é a única nessa, há milhares de pessoas na mesma situação. O que você pode é fazer a sua parte e se aprofundar em si mesma durante o tratamento - o que eu chamo de despertar. Porque no meio de tanta dor, dúvida e medo, há uma possibilidade de transformação, de salvar a própria vida."
"Lembro até hoje que, quando saí do hospital no primeiro dia, o
médico deu dois tapinhas no meu ombro, com a naturalidade que só eles
conseguem ter, e disse: 'Depois de um ano, tudo isso vai acabar, você
vai ver'", conta sobre o comportamento da equipe médica que a
tranquilizou e a apoiou desde o início. "As pessoas pensam que o câncer
de mama é uma coisa só, mas há vários tipos, níveis, o meu foi
extremamente agressivo. Evitei a superinformação para não me abalar
mais. Fiz questão de esquecer essas palavras técnicas, porque o objetivo
desde o início foi tentar não pensar muito estatisticamente, e assumir
mais a minha subjetividade", explica sobre a temática escolhida para
retratar a sua história.
"Da maior importância"
Até hoje, foram divulgados 5 de 9 episódios, com distribuição
totalmente gratuita, prevista até o fim de outubro, em seu canal no
Youtube. Os momentos foram registrados por seu marido, Marcus Leskovsek,
e editados pelo jornalista Gustavo Kassamba, em uma ilha de edição
criada na própria casa da apresentadora - ambos integram o que podemos
chamar de "equipe íntima". O título do projeto foi criação da própria
filha do casal, Maria, de apenas 10 anos, que aos 5, fez a seguinte
pergunta: 'Mamãe, amanhã, hoje, é ontem?', rememora Daniella: "Naquele
momento, parei para pensar no sentido daquilo porque me surpreendi com a
profundidade da frase, típica da pureza das crianças. Quando decidi
colocar a ideia em prática, senti que o que queria fazer era a síntese
da questão - que acabou virando uma afirmação."
E o significado da união das 4 palavras não poderia ser mais tocante: "Para mim, Amanhã Hoje É Ontem,
expressa que tudo à nossa volta está conectado e vai passar. O
tratamento pode significar muitas coisas e depende muito da vivência de
cada um, mas para mim, foi capaz de mostrar a força do momento presente,
num mundo em que estamos sempre nos projetando no futuro, ou agarrados
ao passado. Essa sequência de acontecimentos na minha vida 'me puxou'
para o presente, foi mais ou menos como um chamado de que precisava
viver o aqui e o agora para superar. E foi algo que a minha filha me
ensinou: a supremacia do 'hoje' sobre qualquer outro tempo que está por
vir ou que já tenha existido."
O maior porto-seguro de Daniella foi, desde o início, sua pequena.
"Eu sentia nela uma confiança, algo que me dizia que ia dar tudo certo.
Ela sempre foi a minha maior razão para suportar tudo aquilo." A
apresentadora também buscou forças nas situações que a mostravam que
aquele não era um problema só seu: "Quando fui fazer a minha
primeira sessão de radioterapia, vi uma criança da idade de Maria e
comecei a chorar. Foi muito dolorido ver aquilo, porque ver é diferente
de saber apenas. E eu buscava alguma inspiração naquilo, de enxergar que
não é um sofrimento só meu - isso, para mim, foi um exercício de
compaixão muito forte."
O medo por trás da palavra
Um dos momentos mais atribulados de todo o processo foi, sem sombra
de dúvida, explicar à Maria porque a mamãe ficaria fraca e perderia os
cabelos de uma hora para a outra: "Não entrei em detalhes para não
assustá-la, mas resolvi abrir o jogo porque ela já estava com 9 anos, e
achei que tinha idade o suficiente para entender o que estava
acontecendo. Foi muito difícil porque há muito medo por trás da palavra
câncer, algumas pessoas nem ousam dizê-la, preferem substituir por
'problema', e isso é muito nocivo para a própria aceitação", analisa.
A 'ficha' dos familiares apenas caiu depois da retirada do tumor: "O
choque é tão grande que eles queriam acreditar que realmente 'não era
nada', mas era. Acho que isso acontece porque é uma questão muito
individual. Percebi muito isso pela minha mãe, que ficava se perguntando
o porquê disso acontecer com a filha mais nova. Cada um tem suas
próprias percepções, que variam muito para quem nunca passou por isso.
Depois eles entendem que possuem um papel fundamental e passam a te
acompanhar nos procedimentos, cuidar de você nas fases em que está mais
fragilizada."
Daniella ainda relata que alguns amigos se afastaram completamente e
acredita isso ocorra porque a maioria das pessoas não sabem lidar com
uma doença tão estigmatizada: "De maneira geral, percebi que as
pessoas não lidam muito bem porque se sentem impotentes e, talvez por
,isso tenham dificuldade de ajudar. Mas também há aqueles que te
surpreendem com tanto afeto. De qualquer forma, tenho certeza que há
muita gente que se isola por compartilhar do medo de encarar a
enfermidade de frente." O projeto foi realizado sem nenhum tipo de apoio
financeiro, contando apenas com a ajuda institucional da clínica onde a
autora realizou o tratamento, a Oncomed.
A perda da imagem construída
"Construí a minha imagem por anos como apresentadora de televisão,
então me senti extremamente abalada quando os primeiros fios começaram a
cair", desabafa sobre sua decisão de não esperar a queda gradual do
cabelo e raspá-lo de uma vez: "Antecipei a perda inevitável da percepção
de mim mesma. Mas com o tempo, isso vai se tornando menos importante -
mesmo que seja angustiante porque todo os procedimentos afetam as noções
que temos do 'feminino' - a mutilação dos seios, a queda capilar. Já
ouvi diversas vezes que 'cabelo cresce', mas todos que me disseram isso
não estavam carecas como eu."
A autora ganhou uma peruca, tentou usá-la mas não se sentia bem -
preferiu o chapéu, a touca, o lenço e até mesmo a ausência dos
acessórios: "Não julgo quem teve uma escolha diferente da minha, porque é
muito duro olhar no espelho e não se reconhecer, mas não deixa de ser
uma tentativa de reconstituir o real. Mas aos poucos você vai deixando
isso de lado, e entende que é mais do que aquilo, que há questões mais
importantes em jogo.
A cura do espírito
Coincidentemente, uma amiga próxima da mineira recebeu o diagnóstico
de câncer na mesma época: "Fomos as primeiras a passar por isso naquele
círculo. E mais tarde descobri que outras mulheres próximas a mim também
haviam travado a mesma batalha, mas nenhuma falava abertamente sobre
isso. Outras pessoas passam a frequentar grupos de apoio. Eu
preferi me aprofundar em mim mesma e documentar tudo isso - como num
memorial, para que servisse a quem precisasse enxergar a doença de uma
forma mais humanizada."
Essa investigação de si trouxe muitas dúvidas, esclarecidas com o
acompanhamento terapêutico: "Também precisei enfrentar tudo muito
rápido, quando soube do grupo já estava fazendo quimioterapia. Acho
sempre muito válido todo tipo de atitude para se sentir um pouco melhor,
porque ninguém atravessa essas turbulências sozinho." Além da
preocupação com a sanidade mental,
Daniella, que já havia meditado
antes, voltou à prática para restabelecer-se espiritualmente: "Como os
procedimentos médicos são muito invasivos e agressivos, passei a fazer
ioga diariamente - sentia que estava mais serena, mais calma. Para
realizar um 'tratamento integralista', é fundamental apoiar-se em várias
fontes que a devolvem toda a energia necessária para continuar."
A mineira ainda relata que os sintomas variam de dificuldades para
dormir até fadiga: "Caminhava regularmente mas dei uma pausa porque a
radioterapia me deixava muito cansada. Também passei a fazer acupuntura e
ingerir alimentos orgânicos para tentar lidar um pouco melhor com as
toxinas violentas que estavam no meu corpo. Sempre acreditei que
redescobrir pequenas alegrias da vida, como a leitura, ajudariam a
aguentar este trauma."
Olhar para o céu
Para as mulheres que, assim como Daniella, estão na luta para alcançarem a cura, um recado: "Antes de mais nada: aceite o diagnóstico. A negação só vai te fazer perder um tempo precioso. Então, concentre-se na sua cura que será ampla: da alma, do espírito, do corpo. E não se esqueça de olhar pro céu. O caminho é como um deserto - árido, longo. Quem passa por isso e quem acompanha de perto amigos e familiares nesta situação sabe que olhamos muito para o chão. Mas a gente tem que respirar fundo e e se alimentar dessa força que a natureza nos ensina diariamente, feita de ciclos, eternos recomeços."
Assista ao primeiro episódio da websérie Amanhã Hoje é Ontem:
https://www.youtube.com/watch?v=nFJkJ_gf91o
Fonte: M de Mulher.
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