quinta-feira, 19 de janeiro de 2012

CÂNCER DE MAMA - O QUE MUDOU DEZ ANOS DEPOIS?

Por Sylvia Leal

É lógico, o impacto emocional que a notícia da doença costuma trazer não muda com o passar dos tempos. A reação varia de mulher para mulher. Entretanto, apesar dos admiráveis avanços científicos, ao encarar tamanho desafio, é de esperar o medo do desconhecido, do perigo e um terrível desamparo, diante da sensação de finitude.

A partir daí, tudo pode ser remexido, abalado. Em geral, questionamos valores, revemos preconceitos, percebemos o que importa, quais as nossas reais prioridades, tentamos descobrir o que (e quem) nos faz verdadeiramente felizes e o que precisa ser afastado, jogado fora... Enfim, sob o impacto de um câncer pode renascer uma nova mulher. Espero que mais forte e crescida, disposta a lutar por seus sonhos e seus amores. Enfim, para ter uma vida que valha a pena ser vivida. Quer saber? Foi o que aconteceu comigo.

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O que mudou dez anos depois?

Depois dele vieram mais três, o último para crianças, ou melhor, para os meus netos. O primeiro livro, porém, pelo qual tenho o maior carinho, nasceu e foi criado a partir de um câncer de mama, diagnosticado, enfrentado (com muita dificuldade, é claro) e bem tratado, em 1994. Sou jornalista e depois de muita pesquisa e entrevistas Brasil afora, várias idas e vindas e algumas desistências, “Por uma vida inteira”, enfim, foi lançado pela Editora Record, em julho de 2000.

Dois anos antes, quando me apaixonei pela ideia e comecei a trabalhar nele, a estimativa para o ano de 1998 era sombria: 32.695 novos casos de câncer de mama. A maior parte em estágios avançados, o que resultava em um número descabido de mortes, reconhecidamente evitáveis para o arsenal científico de então. Aí cabe uma dúvida. Será que neste ponto, de 2000 para cá, alguma coisa mudou?

Falava-se ainda no número reduzidíssimo de mamógrafos em todo o país (cerca de 600) e na baixa capacitação do pessoal para lidar com os aparelhos. E uma notícia surpreendente ocupava os jornais: o surgimento da doença em mulheres cada vez mais jovens.

Recordo que fiquei impressionada, já naquela época, com os resultados de certas reconstruções mamárias. Ontem, hoje e sempre que ganho incrível para nós, mulheres! Parecia algo mágico a reposição do volume e da estética da mama perdida. E tudo por conta do domínio de uma técnica chamada TRAM (Transverse Rectus Abdominal Musculocutaneous), que consiste em fazer migrar do abdome para a mama uma espécie de ilha de tecido, levando junto músculo e gordura.

Tão incrível era, que nada de verdadeiramente revolucionário parece ter surgido na área reconstrutora nos últimos anos. O que se viu foi uma espécie de aprimoramento dos materiais e técnicas sofisticadíssimos já existentes.

Mas e os planos de saúde que continuam relutando em pagar pelo que consideram “supérfluo”? Como se fosse uma heresia desejar reconstruir o seio, sinal visível de nossa feminilidade. Onde foi parar também a lei que assegura a todas as mulheres o direito (sagrado, eu aposto!) de ter sua mama reconstruída cirurgicamente pelo SUS? Estas perguntas continuam sem resposta. E a gente se questiona até quando.

Bem, estamos em pleno 2010. Evoluíram os quimioterápicos e a hormonioterapia. Conhecemos melhor o perfil genético de cada tumor, aumentando assim as chances de cura. A retirada total dos linfonodos axilares é substituída, sem prejuízo, pelo rastreamento de somente um linfonodo, conhecido como “sentinela”. Lucramos bastante, sem aqueles dolorosos edemas no braço.

Agora, os mamógrafos dispõem de tecnologia digital. Isto possibilita avaliar com mais apuro as mamas densas de pacientes jovens. Atualmente, existem 4.000 mamógrafos em todo o país, sendo 1.656 pertencentes ao Sistema Único de Saúde. Além disto, todas nós, depois dos 40 anos, mesmo sem sintomas, temos direito (Lei 11.664) a uma mamografia anual gratuita. .

Uma grande vitória. O avanço pelo qual tanto sonhamos. Não mais detectar tumores e, sim, um certo tipo de microcalcificações que os precedem. Ou seja, descobrir os tumores em estágios iniciais, ainda impalpáveis pelas mãos. Trata-se de um enorme passo para reverter a nossa triste realidade do diagnóstico tardio.

Mais uma vez, se preciso, vamos à luta. Não se pode aceitar que, mesmo alegando uma economia de milhões e outras justificativas, o direito à mamografia gratuita passe a vigorar só após os 50 anos ou que seja feita de dois em dois anos como querem alguns, a exemplo dos Estados Unidos. Convenhamos, lá como em tantos outros lugares, a realidade da Saúde é outra. No Brasil, se quisermos poupar milhares de vidas, não há outra solução: a idade limite é de 40 anos e vale brigar por isto.

Em 2000, dava para concluir com segurança: as campanhas de prevenção provaram-se eficientes e alcançavam a maturidade no alcance de seus objetivos. Sempre encabeçadas por atrizes famosas representaram o primeiro esforço massificado de conscientização da mulher brasileira quanto à importância do auto-exame e da detecção da doença em fases, nas quais se pode falar em cura na quase totalidade dos casos.

A pioneira Cássia Kiss tocou com naturalidade os seios, os meios de comunicação se incumbiram de divulgar amplamente a imagem. Isto era 1988. Você se lembra? Em outros momentos foi a vez de Juliana Paes, Ana Maria Braga, Lília Cabral, etc. Este ano, brilha nas camisetas da campanha a bela Giovanna Antonelli. A fórmula ganhou as ruas, o respeito e a simpatia da população. Sucesso total!

Às campanhas somaram-se outro fator fundamental. Não só as televisivas, mas muitas outras mulheres assumiram com sinceridade, ao vivo e a cores, de forma valente e digna sua luta contra o câncer. Temos muito que agradecer pela derrubada de um tabu. Agora, seguindo seus passos, é possível revelar abertamente: “estou com câncer, mas vou me curar”. Acreditando nisto, de verdade.

Minha admiração e agradecimentos aos amigos e consultores científicos que, com suas valiosas informações, tornam possível o meu trabalho: Jacirema Cléia Ferreira, psicanalista; Dr. Antonio Nisida, mastologista; Dr. Mauro Speranzini, cirurgião plástico.

Fonte: NASPEC.

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